quarta-feira, novembro 29, 2006

Um novo paradigma infantil
A sociedade encontra-se arredada de problemas de extrema gravidade no plano da educação. Distraídos com um ambiente dito de mudanças radicais, a que se anexa o rótulo de urgentes, descura-se a investigação de fenómenos alarmantes, que nos confrontam com um perfil infanto-juvenil paradigmático. De facto, a realidade é esta: as nossas crianças são estruturalmente diferentes. Preocupado, o Monge, põe à consideração dos leitores fenómenos de cariz psico-sociológico, que deveriam estar na base de medidas sustentadas de prevenção e remediação, condicionantes da reestruturação do sistema educativo.
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Síndrome do Pensamento Acelerado

Cury aponta o excesso de estímulo da TV, de conhecimento como a nova mudança nos paradigmas educacionais. “O estímulo dobra a cada cinco anos o que acontecia a cada 200 anos” diz. Além disso, para ele, a paranóia do consumo e da estética estimulou os fenómenos. “São eles que lêem a memória e constroem cadeias de pensamentos, produzindo uma nova síndrome chamada Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA)”, afirma Cury complementando que, no mundo todos cometem um crime contra a mente das crianças, dos adolescentes. “O SPA é caracterizado por baixa concentração, dificuldade em lidar com estímulos da rotina diária, irritabilidade, esquecimento, ansiedade intensa”. No livro, o autor grita a dezenas de países, onde a obra está sendo publicada, que a sociedade moderna comete um grave crime contra a juventude mundial. “Temos que reinventar a educação”, afirma.

Augusto Cury

Médico psiquiatra, escritor e cientista, é pós-graduado em Psicologia Social. Pensador, pesquisador da Psicologia, desenvolveu em 17 anos a primeira teoria brasileira sobre a construção da inteligência, denominada de Inteligência Multifocal, publicada em 1998.
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Síndrome do Imperador

Em Espanha, face ao acréscimo de comportamentos agressivos de crianças contra os progenitores, investigam-se as causas de tais comportamentos invulgares. As crianças abrangidas pelo estudo demonstram não possuir consciência dos limites. Controlam o ambiente familiar, dão ordens aos pais e fazem recurso à chantagem emocional. Na raiz dos problemas estarão erros educativos.

Segundo Vicente Garrido, psicólogo, investigador da Universidade de Valência, “ (…) o sistema nervoso destes miúdos revela-se incapaz de processar empatia, compaixão e responsabilidade – eles, simplesmente, não sentem culpa”. Existe, consequentemente, uma dificuldade em processar emoções morais. A causa de tal disfunção residirá nos padrões de conduta reguladores da sociedade actual – o facilitismo, o consumo e a ausência de limites familiares e sociais.

Muitos pais deixaram inculcar nos filhos a ideia que tem direito a tudo. Estes, à medida que crescem, forçam os limites dos adultos, visando impor os seus.

Carlos Poiares, psicólogo, remete-nos para “ (…)uma sociedade niilista, hedónica e com filhos de agenda, fruto de pais sobreocupados”. A ausência de valores reguladores e o predomínio compulsivo da busca do prazer imediato seriam objectivos que conformam tais comportamentos.
As crianças em que se detectou a síndrome referida apresentam um determinado quadro comportamental, a saber:

Falta de autocontrolo;
Incapacidade de empatia;
Recusa do cumprimento de tarefas;
Visão dos pais como extensões de si próprias;
Estabelecimento de exigências;
Abuso da chantagem emocional;
Recurso à ameaça e ao insulto;
Agressividade e impulso destrutivo.

In Visão

domingo, novembro 19, 2006


Alunos do secundário, mostrando dominar com mestria competências no uso das novas tecnologias de informação e comunicação, organizaram, em tempo recorde, significativa manifestação contra as aulas de substituição.

Pais acusam professores de manipulação de alunos adolescentes, invocando o seu maléfico poder de influência junto dos seus educandos.
Renomados especialistas referem que tal reacção se pode designar de ciumeira espontânea e que constitui uma manifestação do inconsciente face à progressiva perda de autoridade dos pais.
Acrescentam ainda ser natural que, face ao número significativo de horas em que docentes e alunos estão em presença, estes tendem a procurar modelos naqueles. Este facto constitui uma alteração aos clássicos modelos de formação da personalidade infanto-juvenil mas encontra justificação na diminuta influência da família contemporânea, instituição praticamente ausente.
Testemunhas presenciais relatam que, num acesso de violência, um pai terá puxado as orelhas ao filho, vociferando:
- Sua besta! Então em casa não me obedeces e aqui fazes tudo o que aqueles facínoras te pedem?
E deste modo coarctou, drasticamente, o legítimo exercício da cidadania do seu estimado rebento.

quinta-feira, novembro 16, 2006


Roger Chaput - Paris Street Scene
A RUA
A Rua soa pejorativamente nos corredores da corte. Para os actuais cortesãos é abjecta, obscena, indigna. Para os mentores da sua propaganda é conotada com as mais reles intenções da populaça. O Monge assiste a uma nova revolução linguística. Não, não é aquela das palavras infindáveis e indecifráveis, que uma elite fundamentalista, pretensamente de vanguarda, quer incorporar no curriculo do Português. É um fenómeno sociológico carregado de significado. Por exemplo, a palavra Excelência releva nos discursos. Dir-se-á que é a nova Utopia desta velha Era. Um indivíduo intelectualmente honesto nunca se considerará excelente. Excelente é uma palavra que não joga com a imperfeição da natureza humana. No entanto, o Monge acredita que, para uma nova espécie de indivíduos com egos do tamanho das suas ambições, a Excelência seja uma meta exequível. De facto, a Excelência apresenta-se, sorrateira e perfidamente, como uma justificação para a segregação, para um exercício de facto da oligarquia.
Naturalmente curioso, o Monge foi procurar o sentido de oligarquia e ficou estarrecido. Vejamos:
Oligarquia é um sistema político e social onde o poder é exercido por uma elite dirigente que controla interesses importantes relacionados com o poder. Este grupo dirigente legitima, por vezes, a violência e a riqueza, para atingir e se manter no poder. E, por isso, este poder nem sempre é exercido pelos mais capazes e virtuosos.
Qualquer semelhança com a realidade é erro da enciclopédia. Mas que dá para pensar, lá isso dá.
O vocábulo MÉRITO também constitui um modismo. De facto o mérito sempre existiu e sempre se recomendou. Mas como um reconhecimento e não como um instrumento. Estes são dois vocábulos que a dita elite, pouco criativa, incorporou à fartazana no seu discurso e nas suas intenções.
Na óptica dos tais, a Rua é um local pouco recomendável, frequentado por pessoas pouco recomendáveis. Eles só a frequentam de passagem, com olhos obstinadamente fechados e protegidos pelas muralhas envidraçadas dos seus carros oficiais. Não a ouvem, não a escutam. De facto detestam-na.
E, no entanto, a Rua é a Vida. É também o palco das derradeiras batalhas. É o último retiro dos oprimidos, dos desavindos com a fortuna, dos joguetes do destino e também dos lutadores, daqueles para quem a resignação é palavra sem sentido. É aí, na Rua, que esses, orgulhosamente assumidos como Gente da Rua, vão largando pedaços de si como se fossem condecorações. É nessas escaramuças do quotidiano que espelham o seu mérito. E é no seu resultado que procuram a Excelência.
E desgraçado de quem, ostensivamente, não ouça o som da Rua nem nela veja os sintomas purpurinos do descontentamento crescente. Desgraçado de quem confie em artificiais unanimismos para inglês ver. O unanimismo não se recomenda. É uma manifestação de subserviência, traiçoeira e falsa, para quem cometa o erro de a tomar por certa.
Pois o Monge ainda acalenta esperanças de que a oligarquia vá urgentemente para o olho da dita. Para bem da Excelência daquele futuro avesso a qualquer tipo de desigualdades e injustiças.
Palavra do Monge.

quinta-feira, novembro 09, 2006


O Fim do Estado de Graça
Não era preciso ser muito perspicaz para intuir que a Saga contra o Estado constituiria o feitiço que se voltaria contra o Feiticeiro. O Monge sempre considerou um paradoxo que se colocasse à frente do Estado quem, de facto e muito explicitamente, o quer destruir. Isto só foi possível com uma imperdoável traição ao eleitorado, consumada numa descarada quebra de promessas. Por isso, o poder foi conseguido com base na mentira e na hipocrisia. E, ainda pior, passou a ser exercido de forma autocrática, rígida, avessa ao diálogo e à concertação. Metodologias muito parecidas com aquela outra senhora de triste memória.
Esse autismo suicida conseguiu aquele prodígio de difícil prognóstico: a unicidade sindical. Só que esta é muito mais letal do que a outra, a dos velhos tempos. É uma espécie de geração espontânea, uma consequência muito física das leis da acção-reacção. Poderemos enunciá-las assim:
-Qualquer agressão determinará uma consequente reacção;
-Essa reacção será, no mínimo, proporcional ao potencial agressivo;
-A escalada de acções/reacções progredirá exponencialmente.
Por consequência, e dada a rigidez negocial manifestada pelo Governo, era tão obviamente inevitável que a indignação extravasasse para fora dos circuitos formais de concertação. A indignação saíu à rua de forma há muito não vista. Isto é tão natural como a própria sede. É uma questão de sobrevivência. Em caso extremo, é guerra declarada, com todos os efeitos nefastos que lhe são inerentes.
Estamos pois em guerra, a qual o Governo finge não ver. O uso e abuso da propaganda governamental através do acesso privilegiado aos media determinaram o recurso a meios de igual potencial mediático por parte dos alvos dessa propaganda. Deste modo se justificam manifestações gigantescas e adesões maciças a greves como aquelas com as quais nos confrontamos. São avisos claros à navegação. São sinais a ter em devida conta.
O estado de graça socrático chegou ao seu termo, concomitantemente com o término do estado de graça da presidência republicana de Bush. Esta alusão não é despropositada. Vejamos um facto recentemente tornado público. Um alegado guru da economia, finlandês por nascimento, debita perante um público de enfatuados e subservientes economistas. Reparemos na sua indumentária: botas texanas, t-shirt e blusão xadrez. Uma ausência de vulto: o típico chapéu de abas largas. Este finlandês não é finlandês, é americano, neoliberal dos quatro costados, costados estes voltados ostensivamente para a tradição da sua Europa natal: a do Estado Social ou do Estado Providência.
É pena. O Monge ficou desiludido. Confiava na criatividade finlandesa. Ingenuamente, não sabia que a Finlândia bebera inspiração num sistema que não é o nosso e que não deve servir de exemplo para ninguém. A não ser que se seja partidário da competitividade sem peias, de um individualismo cego, enfim, das leis darwinistas aplicadas ao social e ao económico. E o nosso governo bebe inspiração na mesma água infectada. Palavras para quê!
O Monge não vai por aí. Mas fica satisfeito com o toque a finados do estado de graça socrático. E também do de Bush, pois isso só lhe fica bem.
Palavra do Monge.