quinta-feira, dezembro 25, 2008

segunda-feira, dezembro 15, 2008

É Urgente Reconstruir

Dicas para um trabalho de reconstrução social, de resposta à crise originada pela deriva à direita de má memória.
"1º-Reconhecimento da centralidade do papel do Estado. O termo 'Estado estratega' foi já utilizado para caracterizar o que agora, mais do que nunca é necessário: um Estado que em nome de prioridades públicas reassume o controlo de sectores estratégicos, se responsabiliza pela provisão de serviços públicos e pela gestão do território, e que utiliza os meios de que dispõe para incentivar e orientar o investimento privado. Entre nós é urgente compreender que a redução dos défices e das dependências externas, que efectivamente crescem a taxas alarmantes, depende de uma reorientação do investimento privado dos sectores abrigados da concorrência internacional, para a produção de bens transaccionáveis, exportáveis e capazes de substituir importações. Em Portugal é preciso contrariar a livre circulação de pessoas, bens e capitais entre o público e o privado; é preciso separar serviço público de negócio privado.
2º-Valorização do serviço público. “O nosso País não está condenado a escolher entre serviços decadentes e burocratizados, de um lado, e a erosão do Estado conduzida segundo a ideologia gestionária da modernização, do outro”, disse Jorge Bateira. Existem outras modernizações possíveis que respeitem os funcionários do Estado e os vejam como pessoas que podem e querem valorizar-se e ser actores de mudança. Reformas que começam por ouvir aqueles que são os rostos da Administração Pública e os cidadãos. Modernizações que, sem reduzir os servidores do Estado à condição de oportunistas e egoístas, nutram os valores característicos da ética de serviço público.
3º-Combate à desigualdade pela valorização do trabalho. A provisão pública de serviços aos cidadãos é apenas um dos instrumentos do combate às desigualdades. O caso português, como tantos outros, é ilustrativo das limitações das políticas sociais meramente reparadoras. A par das políticas reparadoras é necessário desmercadorizar o trabalho. Reconhecer que a repartição do rendimento depende de instituições sociais e de políticas. Que toda a legislação que regula as relações de trabalho, a par das políticas macroeconómicas que podem estimular mais ou menos o emprego e orientar melhor ou pior o investimento, são determinantes fundamentais da repartição primária. Isto é tanto mais importante quanto o desemprego e a exclusão deixaram já de ser os únicos mecanismos geradores de pobreza e o próprio sistema produtivo voltou a produzir, a par de mercadorias, trabalhadores pobres."
José M. Castro Caldas, in Ladrões de Bicicletas

Notas para um Debate

Publicado por João Rodrigues, no blogue Ladrões de Bicicletas. Actual.

"Contribuir para a construção do que Manuel Alegre designou por Estado estratega é uma das tarefas da esquerda socialista. Esta ideia foi também abordada por Jorge Bateira em artigo, que vale a pena recuperar, onde defende que se repense a relação entre Estado e mercados como construções políticas passíveis de várias configurações. Um Estado estratega tem de ser capaz de disciplinar o poder empresarial privado e de impedir que este sobreviva através da transferência sistemática de custos para os consumidores, para os trabalhadores e para a generalidade dos cidadãos, sob a forma, por exemplo, de produtos perigosos para a saúde, de salários baixos, de más condições de trabalho ou de actividades poluidoras.Outras práticas, quase sempre predadoras, devem ser também bloqueadas. Estou a pensar na entrada de empresas privadas no campo das actividades tradicionalmente associadas ao Estado Social e à gestão de equipamentos e infra-estruturas públicas. É preciso travar a busca de lucros à custa do esvaziamento do Estado e da perversão dos serviços e equipamentos públicos. Como já aqui defendi, esta é uma das mais pesadas heranças da «esquerda moderna» rendida à última fase do neoliberalismo agora em crise. Um Estado estratega tem de mobilizar os instrumentos de política disponíveis para encaminhar o sector privado para as actividades de produção de bens transaccionáveis para exportação. É aqui que as virtudes do empreendedorismo podem ser testadas. Os apoios públicos a sectores económicos, em tempos de crise, devem ser canalizados para a sua promoção. Um sector financeiro público cada vez mais robusto e capaz de forjar uma política de crédito adequada pode ajudar.
Isto passa também por traçar linhas de protecção em torno dos serviços públicos e de sectores naturalmente monopolistas. É também por isto que a provisão pública de bens e serviços sociais e a propriedade pública de sectores estratégicos continuam a ser decisivas. Há muito tempo que as privatizações apenas contribuem para a consolidação de grupos económicos rentistas que capturam reguladores e decisores políticos. Quem quer investir em bens e serviços para exportação quando pode controlar a Brisa, a Lusoponte ou a REN, empresas onde, dada a natureza da actividade, os lucros estão praticamente garantidos?"

VIA NOVA

Transcrição de artigo de Manuel Alegre, no Diário de Notícias. Pertinente.

"Segundo o general de Gaulle, comete-se por vezes o erro de ter razão antes de tempo. Na moção "Falar é preciso", apresentada ao Congresso do PS em 1999, cometi esse erro: "A crise financeira que alastrou, dos mercados asiáticos à Rússia e já ameaça gravemente o Brasil e toda a América Latina, pode minar, de um momento para o outro, pela incerteza e pela volatilidade, o próprio funcionamento dos maiores centros financeiros do mundo. A 'mão invisível' falhou. São os mais ortodoxos ultraliberais, como Milton Friedman, quem vêm agora pedir a nacionalização da banca no Japão."E é por isso que é necessária uma nova esquerda. À escala europeia, primeiro. Mas capaz de se fazer ouvir, também, à escala mundial. À dimensão planetária do actual poder económico, financeiro e mediático, há que contrapor uma alternativa política."Temos de continuar a exigir uma reforma das instituições internacionais, do FMI ao Banco Mundial, para que deixem de ser arautos e agentes do pensamento único. Outra lógica terá de presidir à Organização Mundial do Comércio, para que a livre circulação de mercadorias não se torne em mais um instrumento de enfraquecimento das economias mais frágeis."É preciso regular os mercados financeiros mundiais, cuja ditadura e irracionalidade põem em causa a própria estabilidade dos sistemas políticos democráticos."Que fazer agora?Os defensores do Estado mínimo, ideologicamente derrotados, pedem a intervenção do Estado. Para quê? Suspeita-se que para manter o que está e socializar as perdas. O problema é que, se tudo ficar na mesma, as mesmas causas produzirão os mesmos efeitos.E a esquerda? Como escrevi, também antes de tempo, na moção que levei ao Congresso do PS de 2004: "A esquerda tem de integrar e debater, no seu pensamento próprio, os princípios e os instrumentos possíveis de regulação da globalização: o combate à predação das multinacionais que localizam e deslocalizam investimentos a seu bel-prazer, a taxação das transacções financeiras internacionais, a abertura dos mercados dos países desenvolvidos às exportações oriundas dos países em vias de desenvolvimento, a travagem da proliferação dos off-shores, o combate à economia 'suja' dos tráficos de pessoas, drogas e dinheiro, o combate à exploração de mão-de-obra infantil, escrava ou sem quaisquer direitos sociais, e à degradação ambiental."Propus então um novo Contrato Social. E um Estado estratega, "cuja função não se reduz ao papel de árbitro, mas de produtor de bens públicos essenciais, desde o funcionamento do Estado de Direito à promoção dos serviços de interesse geral e à regulação dos mercados. Um Estado estratega a quem caberá suprir as falhas do mercado e estimular áreas ou sectores qualificados." E acrescentava: "Para desempenhar essa função, o Estado precisa de manter nas suas mãos instrumentos eficazes, como por exemplo a Caixa Geral de Depósitos."Hoje até Alan Greenspan reconheceu que errou ao confiar que o mercado pode regular-se a si próprio. Mas, em 2004, aquelas ideias que propus pareceram arcaicas aos fundamentalistas do neoliberalismo e aos entusiastas da chamada esquerda moderna.Não se sabe que réplicas se seguirão ao tsunami que abalou o sistema financeiro mundial. Nem até que ponto irá a recessão económica e quais as suas consequências sociais e políticas. Sabe-se que nada ficará como dantes. Mas em que sentido se fará a mudança? Era aí que a esquerda deveria ter um papel. Mas onde está ela? Talvez algo de novo possa surgir de uma vitória de Obama. Pelo menos um sopro de renovação. Mas há um grande défice de esquerda na Europa. Uma nova esquerda só poderá nascer de várias rupturas das diferentes esquerdas consigo mesmas. Ruptura com as práticas gestionárias e cúmplices do pensamento único. Ruptura com a cultura do poder pelo poder e com o seu contrário, a cultura da margem pela margem, da contra-sociedade e do contrapoder. Processo difícil, complicado, mas sem o qual não será possível construir novas convergências. Não para a mirífica repetição da revolução russa de 1917, nem para um modelo utópico global. Tão-pouco para segundas ou terceiras vias. Mas para uma via nova, que restitua à esquerda a sua função de força transformadora da sociedade e criadora de soluções políticas alternativas."

quarta-feira, dezembro 03, 2008

Em prol da Ecologia e da Higiene Educativa



Não existem dúvidas. A Educação deste país está ferida de morte com causa bem conhecida: a sua ministra, a sua irredutibilidade, a sua má intencionalidade, bastante incompetência e muito desconhecimento da área que devia dominar. De resto, sabemos claramente a razão da sua escolha. E esta não foi, certamente, pugnar pelo desenvolvimento do sistema educativo, com ampla participação dos seus intervenientes, nos termos que um intrincado paradigma sócio-familiar, económico e cultural exige. Por isso, a sua competência técnica era descartável. Tinha a importância de um simples guardanapo de papel, com iguais efeitos perniciosos em termos ecológicos. O que era necessário, isso sim, era implementar um cortex definitivo e radical no orçamento para a educação, na prossecução de um objectivo que agora se comprova como um tremendo erro, que contribuiu significativamente para exacerbar o presente cenário de crise. Esse objectivo era a erradicação do, então, sacralizado défice.

Para isso, repito, não era necessária competência técnica e profundo conhecimento da área de tutela. Bastava manha, má fé, manipulação da opinião pública, arregimentação dos media, teimosia até mais não, a que muita basófia parola vulgarmente designa como "coragem política".

É evidente que este Monge pasma com a confrangedora ignorância demonstrada pela sociedade em geral acerca dos problemas, muitos e graves, com que se depara a educação no país e no mundo. Muitos encarregados de educação e outros parceiros com responsabilidade e interesse na temática opinam, de forma muito superficial e artificiosa, sobre a posição inauditamente firme dos professores no presente contexto. Pois muito bem. Paciência, persistência, costas largas e a dose certa de desdém fazem parte da resposta.

A presente conjuntura educativa é extremamente singular e requer uma abordagem delicada, abrangente e multidisciplinar. Mais do que semear ventos, desmotivações e crispações numa classe profissional cuja intervenção será decisiva na análise e resolução da vastidão e diversidade dos candentes problemas familiares, sociais e económicos que enformam a dita conjuntura, urge cativar e mobilizar professores. Em suma, reconhecer a importância de uma classe profissional cujo saber, experiência e competência não são descartáveis, ao contrário da ministra, numa estratégia de resolução.

Esta seria uma postura de bom senso, de sentido de Estado, de verdadeira defesa do interesse público. De facto, estas não são as qualidades da ministra da educação. Tão pouco do primeiro ministro que a sustém para além do razoável.

Por isso, importa continuar a luta. A bem da educação, do país e daqueles que não vêem, ou obstinadamente, não querem ver. Que alguém os ilumine.

E que se descarte quem de direito.

Palavra do Monge