sexta-feira, agosto 10, 2007

Salvador Dali




O DECLÍNIO DO ÚLTIMO IMPÉRIO



"A taxa de natalidade portuguesa era, em 1960, de 24,1 %, em 1980, de 16,2 %, em 1990, de 11,7 % e, em 2005, de 10,4 %. Temos, em 2007, menos 1/3 de nascimentos do que tínhamos na década de 80 do século passado."


" O índice sintético de fecundidade para assegurar a sustentabilidade de gerações é de 2,1 filhos por mulher."


" Temos 47 000 nascimentos a menos, todos os anos."


Feliciano Barreiras Duarte, in A Visão



Antes da revolução, a população buscava o seu sustento, com métodos ancestrais, na terra-mãe. Vivia-se, tão somente, para sobreviver. Conjugava-se a sobrevivência no presente. O passado estava repleto de rotinas e, sobretudo, era um repositório de experiências, sempre vivas, por tão fundamentais. O futuro, cruamente previsível, era inoportuno e tão desconfortável como uma carga de mosquitos.


De facto, vivia-se uma ruralidade medieval. O tempo arrastava-se ronceiro, parco de novidades e mudanças. Era contado e medido nas estrelas. Aprendido em saberes que escorriam, à boca do fogo, numa roda feita de gerações.


A pobreza grassava, num cortejo de sequelas irreversíveis. Mas as famílias eram grandes, enormes. A criançada proliferava, num repto orgulhoso, pleno de raça, à arrogância ditatorial do natural salve-se quem puder. Quantas morriam, mas isso nunca constituiu obstáculo de vulto. Os genes sempre foram transmitidos, como se impunha, em quantidade e qualidade.


De repente, num estalar de dedos, as leis foram mudadas. Rasgaram-se estradas e oportunidades. O futuro deixou de ser cinzento e coloriu-se com o fulgor de mil promessas. As montras passaram a estar ao alcance da mão. Criaram-se expectativas e a vida sorria, em cada labirinto de um qualquer centro comercial.


Mas a contrapartida impôs-se, desde logo. Para responder ao afã consumista e à autonomia económica e social, num anseio merecido, mulheres e homens investiram no trabalho e carreira. A família clássica desmoronou-se. Numa mão-cheia de anos a natalidade atingiu níveis exíguos.


E aqui está o paradoxo. Por esta fresta de oportunidade disseminou-se o germe responsável pela morte do último império. As crianças são uma franja social em extinção, neste império tão senhor de si. Precariedade, mobilidade, generalização de métodos contraceptivos e da IVG, endeusamento da carreira em desfavor da família, reduziram drasticamente o número de nascimentos.


Sem reposição das gerações a sociedade ocidental definha. Presentemente vive-se melhor, mas há crianças a menos. Há décadas atrás vivia-se mal mas a riqueza fundamental coabitava ali mesmo, naqueles agregados que sobrelotavam casebres.


Será que não podemos fugir a este jugo determinista? Será que o preço do progresso é, inevitavelmente, a degeneração de uma comunidade? Ou será que a igreja tem razão? Haja alguém que responda, mas depressa que, por este trilho, não vamos lá.


Palavras do Monge




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