domingo, outubro 26, 2008

A Respeito de maiorias absolutas




O nosso primeiro releva as virtudes da maioria absoluta. Justifica-o com a necessidade de decapitar, trinchar, esmagar o que designa por certos corporativismos. Alguns. Não todos.




O Monge assume-se como democrata. Por isso, respeita o princípio da livre associação. Prefere este termo ao de corporativismo. Este soa-lhe a terminologia azeda, ressuscitada a partir de sabe-se lá que estranhos desígnios. Mas vai usá-la, para facilitar a contextualização.




A génese de uma associação, profissional ou de qualquer outra natureza, emerge de uma necessidade. Por um lado, de auto-defesa contra certos ataques mais ou menos venenosos, mais ou menos dissimulados. Por outro, pressupõe o reconhecimento da sua importância social. Visa ainda assumir-se como elemento potenciador de uma resposta coesa a necessidades grupais. Pode, eventualmente, ter como objectivo a assunção do poder.




Neste sentido, eu atrever-me-ia a designar os partidos como corporações de indivíduos, enleados num cerne de princípios, valores e objectivos comuns, coniventes com um projecto de conquista de poder, visando a intervenção ou mudança social. São, indubitavelmente, pilares da democracia, desde que as suas acções sejam conformadas pela regulação constitucional, no respeito consciente pelo primado da separação de poderes.




Existem, evidentemente, associações proibidas, catalogadas com o exercício pernicioso de maiorias não legitimadas ou sustentadas por tentativas de legitimação nada transparentes e segregadoras, conforme comprovam evidências históricas.




O Monge considera as corporações partidárias como entidades essenciais ao exercício democrático do poder. No entanto, não esgotam o espectro das entidades corporativas com intervenção político-social. Deste modo, a emergência de outras corporações é salutar e desejável. Constituem alternativas cuja acção complementa a acção partidária e equilibra a intervenção política e social comunitária.




Podem ser um estorvo, particularmente a projectos de homogeneização e perpetuação do poder.


Assim sendo, são benvindas para a generalidade dos cidadãos e a sua acção é determinante para a dissuasão de tentativas mais ou menos totalitárias. É a vantagem do multilateralismo introduzido nas interacções político-sociais.




O nosso primeiro excluiu à partida o exercício desse multilateralismo, vulgarmente designado como negociação, concertação ou diálogo. O Monge compreende as suas relações promíscuas com a tal maioria absoluta, mas agradece aos tais corporativismos a sua acção preventiva ou reactiva.




Maiorias absolutas não. Escaldam que se fartam. Não se peça a gato escaldado que repita a experiência. O Monge já tem medo até da água fria. Há limites para o sadomasoquismo.




Palavra do Monge








quinta-feira, outubro 16, 2008

Lições da História




Li na Visão um artigo.

Esquece-me o nome do autor. Só sei que escreveu bem. Concordei, abismado com a raridade.

Recordou os momentos complicados da grande recessão. Recordou a emergência providencial de Keynes e dos seus princípios essenciais, relevando a importância do Estado e das suas funções essenciais:


- Papel regulador da sociedade, incluindo a economia;

- Garantia dos serviços básicos essenciais, sem discriminação;

- Investimento motor da economia, em contra-ciclo, gerando produtividade e emprego.


O Keynesianismo correspondeu a um período de bem estar e desenvolvimento. Bruscamente, surgiram os economistas da nova vaga. Keynes foi súbita e deliberadamente segregado. Apregoou-se a liberdade de mercado, a competitividade sem freio, o individualismo foi imagem de marca. Um desses economistas até viria a receber um prémio Nobel: Milton Friedman. Um desperdício que a história agora confirma.

Saliente-se que este governo embarcou, à margem da natureza do partido e dos seus princípios mais sagrados, nas ideias neoliberais. Contratos a prazo, precaridade, legislação laboral agressiva e parcial. Perda do poder de compra, despedimentos, desumanização do vínculo laboral. Estratégias de confronto com trabalhadores do Estado, crispação, arrogância, exclusão do diálogo, concertação nula. Pressão sobre as famílias, fragmentação dos laços familiares, separações, ausências, crianças encaixotadas. Stress, desequilíbrio físico e psicológico, ansiedade.

Abandono de projectos de vida, desesperança. Acréscimo de criminalidade violenta, surtos de choques interculturais.

É um panorama sombrio, com causa próxima no desempenho de um governo de maioria. Abaixo as maiorias. As maiorias e as mudanças propostas pelas maiorias. Não procuremos a mudança pela mudança. Queremos que ela constitua instrumento de progresso e bem-estar social. Estas mudanças não! Mais vale estar quedinho e caladinho. Não bulir.

Por tudo isto não culpemos a conjuntura internacional, um atestado arrasador do capitalismo neoliberal. Não. A crise interna já vem de há meia dúzia de anos atrás. De atitudes, acções e estratégias inapropriadas. Da falta de sentido de Estado da governança. Da intrusão da economia no poder político. Da falta de independência e de honestidade de quem governa.

Mas Deus é capaz de estar com os socráticos. Esta conjuntura deve ter sido encomendada em devido tempo. Aqui está uma boa desculpa. Para quem sofra de miopia, claro.


Palavra do Monge

terça-feira, outubro 07, 2008

A Crise Anunciada

Aroeira





Há uns tempos foi o comunismo. Desabou fragorosamente, com os aplausos daqueles que pretendiam a hegemonia mundial. Oportunistas militantes defenderam e difundiram teses que apontavam para uma via de sentido único, que se designou como capitalismo neoliberal. Bill Gates designa-o como capitalismo criativo, enaltecendo as potencialidades de intervenção solidária que tal sistema permite. De facto é uma espécie de sopa dos pobres, a prática da caridadezinha. São visões tacanhas do mundo e do Homem, encarado este como mero instrumento de produção. Diria eu que é um novo sistema esclavagista, que fornece a muitos apenas os meios de subsistência essenciais à produção de trabalho.


Desta vez foi o capitalismo, na sua versão bestificada e selvagem, sustentada pelo apelo ao individualismo egocêntrico, pelo princípio do estado mínimo e pelo dogmatismo de um mercado aberto e livre, sem peias nem reservas. Estoirou, como se previa. E todos pagam pela incompetência e má fé de alguns. Incompetência de governantes, gestores e empresários que pugnaram pela precaridade, mobilidade e instabilidade a vários níveis dos trabalhadores. Cegueira e parca inteligência de governantes e afins que não compreenderam que a estabilidade de emprego gera outras estabilidades e, por conseguinte, é factor de desenvolvimento. Cegueira destes protagonistas às lições da história, que aponta para crises cíclicas do capitalismo. É preciso destruir para desenvolver. Constatemos a falta de originalidade.


Governantes de vistas tolhidas, líderes e gestores incapazes de ver mais longe do que o seu umbigo. Que pegassem no exemplo de Ford. Estabilidade de emprego e salários dignos foram a sua estratégia para o desenvolvimento. Humanização nas relações laborais envolveram trabalhadores e empresário em objectivos comuns para benefício mútuo.


Mas gestores, empresários e governantes de hoje são exasperadamente banais e afinam pelo mesmo diapasão. Governantes sem perfil de homens de estado, profundamente implicados com sectores que não os da coisa pública ou do bem comum.


A crise esperada aí está. Quem a vai pagar é o mexilhão do costume. Mas o mexilhão que se mexa e assaque responsabilidades a quem de direito, ou de direita. O mundo não pode ficar o mesmo. E a solução é tão simples. Oportunidade de trabalho estável para todos. Salário digno desse nome. E o desenvolvimento virá por acréscimo, muito naturalmente.


Valha-nos Santa Luzia.


Palavra do Monge