"Num país que ainda recentemente mostrou ser maioritariamente de esquerda, causa estranheza que o candidato da direita tenha uma vantagem tão forte em relação aos candidatos de esquerda, a ponto de poder ganhar as eleições na primeira volta."
Boaventura Sousa Santos
Visão
19 de Janeiro
PÉS NA TERRA
O Monge fica siderado com as afirmações de pessoas de inegável prestígio e provas dadas, como é o caso de Boaventura Sousa Santos. Tanto mais que, no mesmo artigo, ele refere "Não se pode atribuir tal facto a um tão mau desempenho do governo socialista que os cidadãos pretendam manifestar a sua frustração, votando massivamente no candidato da direita". Pois é, as grandes cabeças também se enganam. Principalmente se se encontram tão distanciadas da realidade, que a sua imagem lhes surge desfocada. Neste caso, um maior envolvimento, um maior contacto metodológico com a dinâmica social, do tipo observação participante, permitir-lhe-ia refrear o vigor da inferência supracitada. E evitar-lhe-ia o erro crasso na conclusão. E também a surpresa e a frustração. Esmiucemos o facto. A subida de Sócrates ao poder deveu-se a um descontentamento de franjas sociais fragilizadas, sujeitas aos ataques de um poder político demasiado conotado com o poder económico, na prossecução de uma estratégia neoliberal de emagrecimento do Estado e, consequentemente dos seus poderes regulador, fiscalizador e redistributivo. Por consequência, houve uma transferência de votos, essencialmente provenientes de uma classe média acossada e de todo um sector de servidores do Estado atingidos nos seus direitos. Essa deslocação de votos sustentou-se na esperança de um arrepio nas medidas reformistas esboçadas e no pressuposto de que a ideologia e a prática socialista nunca as viabilizariam. Sócrates traiu estas esperanças e, neste sentido e para este eleitorado, as medidas encetadas materializaram, de facto, um mau desempenho do governo socialista. Esta frustração foi tão dolorosa que, nas autárquicas, imediatamente a seguir, o PS sofreu uma confrangedora e estrondosa derrota eleitoral. Um investigador na área social deve ler estes sinais como os meteorologistas prevêem o tempo ou os sismólogos antevêem os terramotos. São factos concretos que, associados a outras tendências, prefiguram cenários que sustentam conclusões. No seguimento da continuidade das medidas altamente lesivas da população em causa, grande parte do eleitorado, goradas que foram as suas expectativas, retrocedeu ao ponto de partida e outro dispersou-se por outras candidaturas. Para o Monge, isto não foi uma surpresa. O que o surpreende é que especialistas de renome na área sociológica cometam erros tão flagrantes de análise e mostrem estupefacção perante as circunstâncias. Em quem poderemos confiar então, para que as iniciativas de quem nos governa primem pela equidade, pelo bom senso, pela adequação à realidade? Valha-nos o senso comum, que o outro anda algures, perdido como as mentes dos nossos especialistas. Palavra do Monge.