sexta-feira, janeiro 06, 2006

O ERRO DE SÓCRATES
O monge soube, pelos caminhos ínvios da comunicação social que temos, que o Presidente Sampaio qualificara de corajosas as medidas de contenção socráticas. Habituado como está a saídas menos airosas de elementos da outrora família socialista, que contrariam, pela palavra e pela acção a sua cartilha ideológica, ele já não se admira com o discurso.
De facto, estas medidas e esta postura, as primeiras, de cortes indiscriminados e despudorados sobre trabalhadores do Estado e a segunda, de absoluta e arrogante falta de diálogo e de concertação, nada têm de socialistas e muito menos de corajosas. Portanto, Sócrates não é corajoso, porque assume o poder de forma discriminatória, de acordo com directrizes de uma minoria detentora de grande poder económico, cuja ambição é controlar o poder político, destruir o poder regulador e redistribuidor do Estado e manipular os cidadãos trabalhadores fragilizados a seu bel-prazer. Está sustentado pelo poder económico, apoiado pela comunicação social, no usufruto de um poder político. Desta forma, não lhe custa ser corajoso.
Seria corajoso, isso sim, se afrontasse de peito feito, a actual ofensiva de cariz neoliberal que, após a queda do muro de Berlim, se espraia avassaladoramente por este nosso pobre mundo.
A história não perdoa e a acção socrática ficará indelevelmente nela gravada, não pela coragem demonstrada, mas sim por uma cumplicidade servil, que traz mais estragos que benefícios. Navegar a favor da maré não é um acto de coragem, é uma manifestação de impotência.
A seu tempo veremos que, fragilizando com medidas pouco ponderadas as estruturas do Estado, os portugueses ficarão com piores serviços na Justiça, na Educação, na Saúde. A pessoa mais simples constatará que, reduzindo o quadro de recursos humanos e materiais de um qualquer serviço público, a sua produtividade diminuirá e o cidadão fruidor desse serviço acumulará frustrações. Não sejamos ingénuos: as verdadeiras reformas fazem-se com mais e melhor investimento. As verdadeiras reformas fazem-se com mobilização e implicação dos trabalhadores. Estes precisam de reconhecimento, de dignificação da sua função. E das correspondentes contrapartidas sociais e económicas. Numa era de materialismo o reconhecimento deve ser também material. As palmadinhas nas costas não sustentam ninguém.
O monge torce para que apareça alguém realmente corajoso, com sentido de Estado, impoluto e incorruptível, ponderado e que saiba ouvir, para melhor decidir. Será como tentar encontrar agulha em palheiro. Os verdadeiros heróis, os personagens com currículo e perfil, vão-se sumindo na sombra da sua mortalidade. A humanidade está a ficar orfã. Quantas saudades!
Por agora, enquanto esperamos um improvável milagre, vamos assistindo, ao desfile trágico da vulgaridade, da banalidade, da boçalidade.
O monge sabe, no entanto, que se aproximam tempos em que a crispação social dará lugar à convulsão social. Pessoas verdadeiramente lúcidas já o teriam previsto. A bem ou a mal o equilíbrio e a justiça social serão repostos. O monge acredita que será a mal. Meditemos e não descuremos a acção. Palavra do Monge.

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