domingo, dezembro 24, 2006
quinta-feira, dezembro 14, 2006
HUMORES SULFUROSOS
Os frutos da traição colhem-se tarde. A própria estratégia da ocultação assim o exige. A sua maturação é tardia. O seu aspecto sedutor. Mas o seu sabor é acre, bilioso. Todos os jardineiros da Vida assim o reconhecem. Mas as sementes da traição proliferam, apesar da desconfiança. A alegoria do Éden grava dolorosamente nos primórdios da cultura este conceito ancestral.
Da traição emanam vapores terrivelmente sulfurosos. Chavez assim o diz e lá terá as suas razões, que o Monge reconhece, embora não se identifique com o populismo descarado do homem. Mas as emanações são tardias como a maturação. E os seus efeitos devastadores.
Tais frutos e vapores proliferam num frenesim arrepiante neste cantinho português. Que já não é assim tão português como dantes. Há vapores finlandeses, acerados como gelo. Há vapores suecos, irlandeses e doutras proveniências menos sãs. Mas todos esses fluidos tem a mesma origem, que Chavez compulsivamente localiza: o enxofre típico do extremo ocidente.
As provetas nacionais, onde fervem tais vapores, nunca foram originais. É uma incompetência criativa atávica. Nem a trair somos singulares.
Vem isto a respeito de medidas plagiadas, promovidas pelos nossos doutos governantes, que não tomam em devida conta a nossa idiossincrasia. As ditas inovações são encomendadas extra muros, embrulhadas em maquiavélico papel de fantasia e mascaradas com termos inéditos.
O último exemplo é o da flexisegurança. Um termo falso como Judas. "Etimológicamente" significa liberalização dos despedimentos. Mas a traição nunca rimou com coragem ou com frontalidade. Rima, isso sim, com má fé e hipocrisia. A dita palavra é estranhamente extensa, difícil de ler e de interiorizar. De forma que só a primeira parte importa. A segunda é um mero apêndice, no seu sentido literal. Uma coisa vã para extirpar, mais cedo que tarde.
E tudo isto provém, no timing cirurgicamente planeado, de uma elite corporativa entrincheirada em Bruxelas, habitualmente frequentadora de bacanais desregrados condominalmente fechados e viciada em sulfurite, a nova droga dos donos do poder, neste tempo deveras singular em que, no país do Plano Tecnológico, tectos caem sobre as cabeças de polícias, de manga curta em pleno rigor invernal e em que as seguradoras aumentam os preços dos seus seguros de saúde porque o Estado se demitiu das prestações de serviços básicos sem as quais ele não tem razão de ser.
Boas inalações. Palavra do Monge.
quarta-feira, novembro 29, 2006
Cury aponta o excesso de estímulo da TV, de conhecimento como a nova mudança nos paradigmas educacionais. “O estímulo dobra a cada cinco anos o que acontecia a cada 200 anos” diz. Além disso, para ele, a paranóia do consumo e da estética estimulou os fenómenos. “São eles que lêem a memória e constroem cadeias de pensamentos, produzindo uma nova síndrome chamada Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA)”, afirma Cury complementando que, no mundo todos cometem um crime contra a mente das crianças, dos adolescentes. “O SPA é caracterizado por baixa concentração, dificuldade em lidar com estímulos da rotina diária, irritabilidade, esquecimento, ansiedade intensa”. No livro, o autor grita a dezenas de países, onde a obra está sendo publicada, que a sociedade moderna comete um grave crime contra a juventude mundial. “Temos que reinventar a educação”, afirma.
Augusto Cury
Médico psiquiatra, escritor e cientista, é pós-graduado em Psicologia Social. Pensador, pesquisador da Psicologia, desenvolveu em 17 anos a primeira teoria brasileira sobre a construção da inteligência, denominada de Inteligência Multifocal, publicada em 1998.
Em Espanha, face ao acréscimo de comportamentos agressivos de crianças contra os progenitores, investigam-se as causas de tais comportamentos invulgares. As crianças abrangidas pelo estudo demonstram não possuir consciência dos limites. Controlam o ambiente familiar, dão ordens aos pais e fazem recurso à chantagem emocional. Na raiz dos problemas estarão erros educativos.
Segundo Vicente Garrido, psicólogo, investigador da Universidade de Valência, “ (…) o sistema nervoso destes miúdos revela-se incapaz de processar empatia, compaixão e responsabilidade – eles, simplesmente, não sentem culpa”. Existe, consequentemente, uma dificuldade em processar emoções morais. A causa de tal disfunção residirá nos padrões de conduta reguladores da sociedade actual – o facilitismo, o consumo e a ausência de limites familiares e sociais.
Muitos pais deixaram inculcar nos filhos a ideia que tem direito a tudo. Estes, à medida que crescem, forçam os limites dos adultos, visando impor os seus.
Carlos Poiares, psicólogo, remete-nos para “ (…)uma sociedade niilista, hedónica e com filhos de agenda, fruto de pais sobreocupados”. A ausência de valores reguladores e o predomínio compulsivo da busca do prazer imediato seriam objectivos que conformam tais comportamentos.
As crianças em que se detectou a síndrome referida apresentam um determinado quadro comportamental, a saber:
Falta de autocontrolo;
Incapacidade de empatia;
Recusa do cumprimento de tarefas;
Visão dos pais como extensões de si próprias;
Estabelecimento de exigências;
Abuso da chantagem emocional;
Recurso à ameaça e ao insulto;
Agressividade e impulso destrutivo.
In Visão
domingo, novembro 19, 2006
Pais acusam professores de manipulação de alunos adolescentes, invocando o seu maléfico poder de influência junto dos seus educandos.
Renomados especialistas referem que tal reacção se pode designar de ciumeira espontânea e que constitui uma manifestação do inconsciente face à progressiva perda de autoridade dos pais.
Acrescentam ainda ser natural que, face ao número significativo de horas em que docentes e alunos estão em presença, estes tendem a procurar modelos naqueles. Este facto constitui uma alteração aos clássicos modelos de formação da personalidade infanto-juvenil mas encontra justificação na diminuta influência da família contemporânea, instituição praticamente ausente.
Testemunhas presenciais relatam que, num acesso de violência, um pai terá puxado as orelhas ao filho, vociferando:
- Sua besta! Então em casa não me obedeces e aqui fazes tudo o que aqueles facínoras te pedem?
E deste modo coarctou, drasticamente, o legítimo exercício da cidadania do seu estimado rebento.
quinta-feira, novembro 16, 2006
quinta-feira, novembro 09, 2006
segunda-feira, outubro 30, 2006
terça-feira, outubro 17, 2006
quinta-feira, outubro 12, 2006
segunda-feira, outubro 09, 2006
A QUEDA DA MÁSCARA
Palavra do Monge
quinta-feira, outubro 05, 2006
Transportas teu Fado aos ombros
E o sonho na palma da mão
Vagueias por entre os escombros
De um mundo em convulsão.
quarta-feira, outubro 04, 2006
· Uma, é calma e tranqüilidade para o exercício do seu trabalho, eles precisam estar num ambiente, eles precisam estar rodeados de um ambiente social, precisam estar rodeados de um ambiente comunitário que lhes permita essa calma e essa tranqüilidade para o seu trabalho. Quer dizer, não é possível trabalhar pedagogicamente no meio do ruído, no meio do barulho, no meio da crítica, no meio da insinuação. É absolutamente impossível esse tipo de trabalho. As pessoas têm que assegurar essa calma e essa tranqüilidade.
· E, por outro lado, é essencial ter condições de dignidade profissional. E esta dignidade profissional passa certamente por questões materiais, por questões do salário, passa também por boas questões de formação, e passa por questões de boas carreiras profissionais. Quer dizer, não é possível imaginar que os professores tenham condições para responder a este aumento absolutamente imensurável de missões, de exigências no meio de uma crítica feroz, no meio de situações intoleráveis, de acusação aos professores e às escolas."
- No excesso de missões que cada vez mais se atribuem às escolas estará uma das razões do propagandeado insucesso escolar;
- Que as recentes medidas educativas irão contribuir para o acréscimo de instabilidade na estrutura educativa e, consequentemente, para o insucesso escolar;
- Que as actividades extracurriculares constituem, de facto, uma das missões sem sentido da escola porque visam, prioritariamente, ocupar as crianças face à desvinculação das famílias da sua responsabilidade de educadores;
- Que os professores pecaram por aceitação resignada da sobrecarga de funções sucessivamente atribuídas;
- Que o ambiente agora criado e gerado pela instituição de tutela só prejudica o funcionamento do sistema educativo e a acção docente;
- Que o ataque acérrimo e continuado ao estatuto do docente em nada contribui para restaurar a dignidade profissional, entendida com uma variável essencial à motivação dos docentes e, consequentemente, com repercussão negativa na eficácia da sua acção e no sucesso escolar dos seus alunos.
Pois cá o Monge augura maus momentos para a educação em Portugal em tempos próximos. Mas que se imputem responsabilidades a quem de direito. Professor, faz o teu melhor. Mas insurge-te, revolta-te, dá corpo à tua justa indignação. Ao fim e ao cabo, fazendo-o, estás a contribuir para que não se hipoteque o futuro das próximas gerações.
Palavra do Monge
sexta-feira, setembro 29, 2006
sexta-feira, setembro 15, 2006
terça-feira, agosto 22, 2006
-Maldita chuva!
segunda-feira, julho 24, 2006
Um passante mais regular condoer-se-ia, possivelmente, ao entrever uma figura franzina, trajada de negro, minúscula silhueta por entre o milheiral. Talvez pusesse em causa a força e a persistência que naquele corpo fragilizado de facto residiam.
Um passante conhecido não ousaria esboçar qualquer dúvida acerca da capacidade da artesã daquela obra-prima de sobrevivência. Saberia ler toda uma vida gravada nas rugas daquele rosto magro. Traduziria o brilho daquele olhar profundo de quem muito viveu e viu. Adivinharia as cicatrizes que lhe sulcavam a alma de combatente.
Aquela mulher grudava-se desesperadamente ao passado como forma de resistir à precariedade do presente. Não entendia este ritmo avassalador que a rodeava. Estava definitiva e irremediavelmente ajustada ao ritmo compassadamente marcado pela lua, pelos ciclos das estações, pelo nascer e pelo pôr-do-sol. Nunca o seu pulso fora feito refém de um qualquer relógio. Nunca se deixara subjugar por horários que não fossem os estritamente naturais.
Assumira o negrume da sua viuvez de forma dolorosa e irrevogável. Desta feita, não se tratava apenas de um afeiçoamento cultural, de um perfilhamento cego de costumes ancestrais. De facto, o sentimento de perda que se seguira à morte do seu companheiro atingira-a com uma violência de que nunca se recompusera. A cumplicidade que os unira fora o alento com que enfrentaram e transpuseram, indómitos, dificuldades inumeráveis. Quase sossobrou com a forçada e eterna ausência. Mas a lembrança de uma convivência de muitos anos fora também o elixir da sua recuperação.
Agarrara-se à terra com a força do desespero. E a terra, agradecida, correspondeu-lhe, arrancando-a a um torpor que, a continuar, seria letal. Curvou-se ainda mais sobre os torrões que desmanchava com a ligeireza de décadas de experiência lhe tinham ensinado.
Andar curvada tornara-se a sua postura habitual. Não era apenas o estigma do inexorável desfilar dos anos. Era uma exigência de reverência da terra-mãe. Era o pagamento exigido pela fecundidade. Era um tributo, uma penitência, mas também uma honra e um testemunho.
Mas aquela débil figura reerguia-se quase miraculosamente, deixando vislumbrar todo o carácter, toda a raiva explosiva que dela se apoderava e que deflagrava num estrondoso não a qualquer proposta de negócio daquela parcela de território que era o seu. Mesmo filhos e familiares próximos, que não compreendiam aquela apaixonada ligação a um solo que, para eles, só fazia sentido quando traduzido em números, deixaram de a importunar, de a seduzir com razões que ela jamais compreenderia. Ao fim e ao cabo aquele solo era a sua vida. Abdicar dele seria suicídio.
De modo que aquele local se tornara uma ilha e a viúva a sua exígua população. O passante regular e conhecido admira a sua coragem e a sua persistência. Compreende a sua atitude e o seu modo de estar perante a vida, as suas alegrias e as suas adversidades. Torce para que tal coerência escorrace a superficialidade, o artifício, o vil interesse que se constitui como imagem de marca desta sociedade que idolatra o efémero. Torce para que esta fortaleza continue a resistir ao terrível assédio com pertinácia equivalente.
Palavra do Monge.
quinta-feira, julho 20, 2006
O CERCO
Millet
Muitos chamavam-lhe oásis, a maioria um anacronismo.
De facto, aquele local era uma espécie de bolha, enquistada no tempo, um exemplo raro de resistência às arremetidas vigorosas da urbe.
Tratava-se de uma quinta. Uma área razoável dividida com rigor geométrico por fiadas de videiras rasteiras. Numa das pontas, a menos produtiva, como outrora convinha, quase desprovida de manta morta, elevava-se um barracão robusto, de paredes grossas em pedra granítica, simbólico bastião de anteriores e heróicas lides de sucessivas gerações de lavradores anónimos mas de obra feita.
Como abertura, apenas a porta, de chapa ondulada e ocre, a única concessão detectável ao assédio inovador do presente.
À sua volta brotavam fantasmagóricas gruas, esguias e arrogantes, no cerne de uma inusitada agitação. Máquinas famintas rugiam, ensurdecedoras, escalavrando impiedosamente o solo, deixando nele as feridas do seu afã destruidor.
E, num prazo extraordinariamente curto, mesmo tomando como padrão a vã efemeridade humana, aquele local ficou cercado. Rodeado de edificações de traçado variável, aparentemente sem vínculo congruente, aquele resquício de um qualquer passado ali jaz, indiferente à sua inquestionável solidão.
Um passante menos assíduo surpreender-se-ia, pois aqueles terrenos não apresentavam o desmazelo característico daqueloutros votados a um impiedoso abandono, invadidos pelo torvelinho desordenado de silvados apostados em comprovar os seus atributos competitivos no jogo desregrado da luta pela vida.
Aquele solo e a vida que ele gerava reflectiam a ordem imposta por mão humana, rara mas sábia. De modo que continuava a apresentar as mutações que o ciclo agrícola exige. Vides podadas a seu tempo, bandeiras do milheiral erguidas em ode à labuta do Homem e à pujança da Natureza.
segunda-feira, julho 10, 2006
segunda-feira, junho 12, 2006
terça-feira, maio 30, 2006
segunda-feira, maio 15, 2006
Palavra do Monge
terça-feira, abril 25, 2006
Vinte e cinco alvoradas
Passadas do mês fecundo,
Outras tantas badaladas
Que nos abriram ao mundo.
Vinte e cinco esperanças,
Vezes mil ou talvez mais,
Foram outras tantas lanchas
Que largaram do seu cais.
Vinte e cinco mil grilhetas
Por um sonho se quebraram.
Vinte e cinco mil estafetas
Por um sonho se esfalfaram.
Vinte e cinco mil promessas
Vezes mil ou talvez mais,
Viraram o mundo às avessas,
Mudaram do tempo os sinais.
Vinte e cinco anos se foram
E ainda um pouco mais,
Mil promessas se apagaram
Ou talvez bastante mais.
Vinte e cinco mil vilões,
Ou um pouco mais talvez,
Querem repor os grilhões,
Apagar o sonho de vez.
Cada qual um guardião
Do sonho que Abril gerou
Férreo, não largue mão,
Do que Abril nos legou.
Palavra do Monge
terça-feira, abril 04, 2006
Opa, opa e mais opa! Eh lá... Desta vez o Monge ultrapassou os limites. Começar um enunciado com uma praga não são modos de uma pessoa com o seu estatuto, nem um exemplo para os parcos leitores. Mas reconsideremos. O Ti Belmiro também está a extrasavar os seus limites. Diria mais, extravasa as suas competências e imiscui os seus considerados doutos saberes em áreas de que não percebe patavina. Melhor dizendo, meteu o seu valioso nariz onde não era chamado. Pasmado, o Monge diria que sofre do síndroma AVC (Aquisição Verdadeiramente Catastrófica) - para o país, claro, para a PT em particular e para os trabalhadores da PT , ainda mais particularmente. Pois a referida personalidade atreveu-se a criticar o sistema educativo em termos menos elogiosos. Como está na moda, aliás. Vá lá! Que um comum cidadão, menos imune aos assaltos insidiosos dos media, profira tais insinuações, ainda se aceita, embora tal não o isente de uma proporcional e exemplar penitência. Agora o Ti Belmiro, uma das personalidades ilustres, um conselheiro muito requisitado de governantes e similares, devia mostrar mais contenção. Que percebe ele do estado da Educação? Tanto como a correspondente ministra? Talvez menos, o que, tendo em conta o termo de comparação, é menos que nada. Mas o Monge percebe. Percebe que aquilo que o Ti Belmiro quer são trabalhadores adestrados e amestrados. Devem ser móveis, polivalentes e aceitar a precaridade sem recalcitrar. Nada de espírito crítico, que isso só estorva. Os chefes que pensem e julguem. Os trabalhadores não foram feitos para isso. Nada de solidariedade, que isso contende fragorosamente com a ambiência competitiva instalada. Nada de valores, que isso é um mito pouco conveniente. A não ser que sejam os valores perfilhados pelo ilustre dito. O Monge pasma... e cisma. Então andou-se tanto tempo a apostar na educação para os valores, na sua contribuição para uma sociedade mais justa, mais equitativa, mais fraterna e mais solidária. Tanto tempo a apostar no homem com espírito crítico, dotado de autonomia de pensamento, de julgamento e de acção. Tanto tempo a apostar em cidadãos intervenientes e responsáveis. Opa, opa e mais opa! Perdoem-me a praga. Mas o Monge penitenciar-se-á na devida proporção, o que quer dizer... nada. Palavra do Monge
sábado, março 11, 2006
quarta-feira, fevereiro 15, 2006
O monge constata com preocupação que este mundo é de loucos. Melhor dizendo, este mundo é dos loucos. Necessariamente, quer do lado das ditas e reditas consumadas democracias, quer do lado das presumidas teocracias, emergem os mesmos sintomas de demência crónica e progressiva. No entender do Monge, ascenderam ao poder pessoas que a ele não deveriam ascender. No mundo ocidental, profundamente influenciado pela cultura anglo-saxónica, tal situação é estranha e dificilmente compreensível. Pois que é feito da democracia, do direito de livre escolha e da responsabilidade que lhe está inerente? Teoricamente, deveriam ser escolhidos os melhores, os mais aptos, os mais capazes para conduzir os nossos destinos. No entanto, errámos indesculpavelmente. A nossa consciência crítica esboroou-se perante a demagogia, o populismo, carreados por uma comunicação social desprovida de consciência ética e de responsabilidade política e social. Por uma comunicação social infiltrada pelo corrosivo poder económico. Por feitores de opinião ao serviço de inconfessáveis interesses que não são públicos e, por isso, não pugnam pelo interesse colectivo. Por isso estamos orfãos, orfãos de pessoas credíveis, impolutas, de perfis devidamente alicerçados na tolerância, na ponderação, no bom senso. Qualidades que permitem dizer não, quando a maioria diz sim. Qualidades que recomendam diálogo, quando as palavras se tornam lâminas letais. Qualidades que edificam a tolerância, quando cruzadas e guerras santas são propagandeadas.
A comunicação social está em fanicos, descredibilizou-se. À boa imagem de um capitalismo selvagem, sem peias, em que a usura se espraia irremediavelmente, pegajosa, oleosa como o crude, vive obcecada pelos shares das vendas, das audiências, mandando às malvas os filtros deontológicos. Uiva clamando pela liberdade de expressão, arredada das profundas responsabilidades que lhe estão subjacentes. Contende fragorosamente com outros direitos humanos, que subalterniza.
E aí temos a tão indesejada contenda civilizacional. Esta escalada de intolerância, alimentada por actos impensados de gente com grande visibilidade mediática, que destrói todo um percurso ecuménico de luta pela paz, dura e prolongadamente erigido, vai transformar-se num disputa olho por olho, dente por dente, num esboroar de esperanças por um mundo mais fraterno, no respeito pelas diferenças e pela mais valia que dessas diferenças necessariamente emerge.
Pessoas de bom senso precisam-se. Devem assumir o protagonismo neste tempo de crise, em que cada acto, cada palavra, devem ser maduramente pensados.
O preconceito deve ser, numa perspectiva metodológica, recolocado nos sotãos da nossa consciência colectiva, sem bolas de naftalina, a esmiuçar-se em pó. O extremismo deverá ser considerado postura não grata, o diálogo intercultural preservado e alimentado.
E que se calem os discursos virulentos, tresandando a mofo e de ideias curtas, de comentadores e políticos desclassificados. Que se transfigurem definitivamente em personagens de comédia de um qualquer cinema mudo. Talvez assim possamos esboçar um ligeiro sorriso ou até largar uma incontida gargalhada.
Palavra do Monge.
quarta-feira, janeiro 25, 2006
PÉS NA TERRA